E se ouvíssemos a casa?
A exposição como esse encontro de um grupo de artistas em torno da casa, pensando seus modos de habitar e suas possibilidade de construções de linguagens dentro do campo das práticas artísticas. Entrar no universo da casa é penetrar nas camadas que compõem nosso próprio corpo, entendendo-o como nosso primeiro abrigo. Essa primeira casa, pode ser um lugar de acolhida ou de tensão e as relações entre casa-corpo e corpo-casa, pode nos ajudar a entender a complexidade que existe no habitar. As ambiguidades que a casa carrega podem ser matéria poética e também podem ativar elaborações e leituras sobre as próprias práticas dos artistas e da exposição que propomos na Casa Mulungu.
A partir de encontros e trabalhos propostos por um grupo de sete artistas, buscamos afinidades e contaminações entre a casa e as práticas e pesquisas de cada um. Como um exercício expositivo que coloca um campo de contaminação entre arquitetura, arte e vida, compondo outras formas de habitar a casa em uma aproximação entre o processo de curadoria ao da prática artística. A arte entra aqui como esse campo diluído o mais próximo possível do corpo de quem a habita.
Bachelard vai trazer na “Poética do espaço” um campo de possibilidades de exploração e construção não só poética mais psicanalítica do espaço da casa. A casa enquanto esse lugar que possibilita leituras e interpretações a partir dos modos de ocupação e relação com o espaço, “examinada nos horizontes teóricos mais diversos, parece que a imagem da casa se transforma na topografia de nosso ser íntimo” (BACHELARD, 1957, pp. 196) a esse modo de olhar a casa, Bachelard vai chamar de “topoanálise”. E é pelos seus espaços mais íntimos, como as gavetas, os cofres e os armários, que é possível entender os espaços mínimos como construidores de memória, contribuindo para elaborações de imaginações poéticas cercadas de lembranças. Bachelard vai nomeá-los de “verdadeiros órgãos da vida psicológica secreta”. Toda essa construção poética proposta por Bachelard é uma das chaves na construção do processo dessa exposição que foi cercado também pelas histórias e lembranças que cada artista trouxe em nossos encontros....
...Julia Pereira partindo desse corpo casa e do movimento desses corpos no espaço, formula uma espécie de inventário em suas pinturas. A linha, cor pincelada, compõe uma materialidade corporal que se articula no formato das suas telas, pesquisa que é desmembrada também na vídeo instalação e em sua ocupação na piscina, trabalhos que possuem uma afinidade poética e visual....
Desse modo, incorporamos a casa como ponto de partida para pensar o corpo e as diversas possibilidades de se relacionar com esse espaço para além dos usos funcionais, domésticos e do ócio. Um exercício de fabulação que parte da casa como um corpo a fim de investigar as relações entre esses corpos e a possibilidade de coabitar em um estado de exposição.
Omar Porto